Arquivo pessoal
Quando as tropas russas entraram na Ucrânia no dia 24 de fevereiro, Nadezhda Kulikova, de 71 anos, se preparou para a guerra havia começado. Natural de Donetsk, ela sobreviveu a um conflito armado por oitos anos desde que as forças separatistas pró-Rússia começaram a reivindicar o território no leste do país.
Durante esses anos, ela se recusou a deixar a casa em que viveu durante toda a vida devido ao conflito e após a invasão russa ao território ucraniano, só deixou Donetsk na semana passada, depois de mais de 100 dias de combate entre as tropas de Kiev e Moscou.
Arquivo pessoal
“Foi muito difícil sair da casa em que fui feliz com meu marido, onde meus netos nasceram e foram criados. Tenho memórias associadas a cada canto daquele lugar”, conta Nadezhda.
Por se recusar a deixar o país, ela está morando em Kiev com sua neta Mila, de 34 anos, que insistiu por muito tempo para que a avó saísse de sua região onde as ofensivas militares se concentram.
“Eu me respeito demais para passar meus últimos anos de vida em um albergue”, diz Nadezhda. “Não deixei de acreditar nem por um dia que o exército ucraniano irá libertar nossa Donetsk.”
Para encontrar a neta em Kiev, a ucraniana percorreu um longo caminho para que não precisasse passar pelas zonas de guerra em seu país. Partindo de Donetsk, ela viajou quatro dias pelo território russo até chegar à fronteira com a Letônia, depois seguiu para a Lituânia e para a Polónia, até chegar em Kiev.
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No último sábado (5), Mila reencontrou a avó finalmente. Em 2014, a neta da ucrâniana saiu de Donetsk para morar na capital ucraniana com o objetivo de fugir do conflito contra os separatistas pró-Rússia. Quando a invasão russa atingiu a cidade, ela passou alguns meses em Lviv, cidade no oeste próxima da fronteira com a Polônia, antes de retornar para a região. Aos 34 anos, ela ressalta que já fugiu de duas guerras.
Mila também não quer sair do seu país, preferiu permanecer em meio à guerra ao invés de se tornar uma refugiada, condição de mais de 6 milhões de pessoas que deixaram a Ucrânia desde fevereiro.
“Ela tinha muito medo de deixar a Donetsk porque ocorriam bombardeios todos os dias. Por quase três meses ela só tinha água e eletricidade por algumas horas no dia e quase não havia comida e remédios nas lojas.”
As duas ucranianas têm uma relação muito próxima. Foi a avó que criou Mila depois que a jovem ficou órfã. A guerra fortaleceu esse laço e a preocupação que uma tem com a outra. Depois de várias tentativas, Nadezhda foi convencida por Mila a buscar um local mais seguro para ficar durante a guerra, ainda que fosse sem cruzar as fronteira do país.
“No dia em que ela saiu de Donetsk, um fragmento de bomba caiu no ponto em que ela costuma pegar ônibus todos os dias. Nossa cidade é bombardeada constantemente. À noite eu sei que ela chora quando vou me deitar.”